Compartilhar este conteúdo:

A Reforma Tributária aprovada por meio da Emenda Constitucional nº 132/2023 representa uma das mudanças mais ambiciosas do sistema fiscal brasileiro nas últimas décadas.

Entre seus pilares está a adoção do modelo de tributação no destino, uma transformação com profundo impacto na forma como tributos sobre o consumo são cobrados, repassados e distribuídos entre os entes federativos.

A proposta é simples em teoria: o imposto deixa de ser recolhido no local onde o produto ou serviço é produzido e passa a ser cobrado no local onde ocorre o consumo.

Na prática, isso altera regras que há décadas favorecem estados produtores e prejudicam estados consumidores, um desequilíbrio que a nova tributação busca corrigir.

O que é a tributação no destino?

A tributação no destino é um modelo de cobrança de impostos sobre o consumo que considera o local onde o bem ou serviço é efetivamente consumido, e não onde ele foi produzido, vendido ou faturado. Ou seja, o tributo é destinado ao estado ou município do comprador final, e não ao local de origem da transação.

Esse modelo é adotado amplamente em países que utilizam o IVA (Imposto sobre Valor Agregado), e vem sendo defendido há anos por economistas, tributaristas e órgãos multilaterais como forma de equilibrar a distribuição de receitas e corrigir distorções regionais.

Na prática, a adoção da tributação no destino altera profundamente a lógica do sistema atual brasileiro, que por décadas privilegiou estados e municípios produtores em detrimento dos consumidores. Com a Reforma Tributária, o Brasil dá um passo em direção a um sistema mais neutro, justo e alinhado às melhores práticas internacionais.

Princípio da tributação no destino na Reforma Tributária

O princípio do destino foi incorporado oficialmente à estrutura tributária brasileira por meio da Emenda Constitucional nº 132/2023, que trata da Reforma Tributária.

A partir de sua implementação, os tributos sobre o consumo, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) , passarão a adotar o modelo de cobrança no local do consumo.

Isso significa que:

  • A receita arrecadada com esses tributos será destinada ao estado ou município onde o consumidor está localizado;
  • O local da produção, da emissão da nota fiscal ou da sede da empresa deixa de ser o fator determinante para a arrecadação;
  • O modelo favorece a redistribuição de receitas entre regiões mais e menos desenvolvidas, contribuindo para reduzir desigualdades regionais.

Esse princípio também foi pensado para coibir a guerra fiscal entre os entes federativos, uma disputa que, por anos, levou estados a oferecer incentivos fiscais em troca da instalação de empresas, gerando distorções, insegurança jurídica e perda de arrecadação.

Com o novo sistema, como a arrecadação seguirá o local do consumo, os incentivos fiscais deixam de ter o mesmo peso na decisão de investimento das empresas, fortalecendo a lógica de mercado.

Diferença entre tributação na origem e no destino

A tributação na origem, que predominava no modelo anterior, fazia com que os tributos sobre o consumo (como ICMS e ISS) fossem recolhidos no estado ou município onde o bem ou serviço era produzido ou faturado, independentemente de onde fosse utilizado ou consumido.

Esse modelo trouxe uma série de problemas ao longo das décadas:

  • Concentração de receita em estados produtores (como São Paulo, Minas Gerais e Paraná);
  • Prejuízo para estados consumidores, que não participavam da arrecadação mesmo quando a demanda era gerada em seu território;
  • Guerra fiscal: estados disputam investimentos oferecendo isenções e reduções do ICMS;
  • Insegurança jurídica, com conflitos judiciais entre entes federativos.

Com a tributação no destino, o foco muda: quem consome paga o imposto, e o ente federativo onde ocorre o consumo recebe a receita tributária.

Veja a comparação abaixo:

Critério Tributação na origem Tributação no destino
Local de recolhimento Estado ou município do fornecedor Estado ou município do comprador
Benefício fiscal Favorece regiões industriais e exportadoras Favorece regiões com maior densidade populacional
Impacto econômico Concentra renda em poucos estados Redistribui receita com base no consumo
Efeito sobre a guerra fiscal  Estimula competição entre estados Reduz a relevância de incentivos fiscais
Aderência a modelos globais Pouco comum internacionalmente Alinhados com modelos de IVA adotados no mundo

Saiba mais sobre a Reforma Tributária em: “Reforma tributária 2026: o que você precisa saber?”. 

Como a tributação no destino será aplicada na Reforma Tributária

A adoção do princípio da tributação no destino será um dos eixos centrais da Reforma Tributária e terá aplicação prática nos dois novos tributos que substituirão os principais impostos sobre o consumo: o IBS (estadual e municipal) e a CBS (federal).

Esse novo modelo exigirá ajustes nos sistemas de arrecadação e apuração, tanto do setor público quanto das empresas, mas promete resolver distorções históricas do sistema atual e tornar a cobrança mais justa e eficiente.

Aplicação no IBS (Imposto sobre Bens e Serviços)

O IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) substituirá o ICMS (estadual) e o ISS (municipal). Sua principal característica será a cobrança no destino, ou seja, o imposto será devido ao estado e município onde ocorre o consumo efetivo do bem ou serviço.

Como funcionará, na prática?

Imagine uma empresa sediada no Rio de Janeiro que presta serviço para um cliente em Minas Gerais. No modelo atual, o ISS é recolhido no município do prestador (Rio).
Com o IBS, a receita será repartida com o município do tomador do serviço (Minas Gerais).

Outro exemplo:

  • Uma indústria paulista vende um produto para um consumidor final no Pará.
    • Hoje: o ICMS vai para São Paulo (origem).
    • Com o IBS: a arrecadação vai para o Pará (destino).

Outros pontos importantes sobre o IBS:

  • Tributo compartilhado entre estados e municípios, gerido por um comitê gestor nacional.
  • Não cumulativo, com crédito garantido ao longo da cadeia (sem efeito cascata).
  • Alíquota uniforme por produto/serviço, mas com distribuição da receita conforme o local do consumo.
  • Transição gradual entre 2026 e 2033, com ajustes anuais no peso da origem e do destino para que o mercado e os entes federativos se adaptem.

Essa aplicação visa corrigir a guerra fiscal entre estados e permitir uma distribuição mais equitativa da arrecadação, especialmente para municípios de grande consumo, mas pouca produção industrial.

Aplicação na CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços)

A CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) será o tributo federal que substituirá PIS e Cofins. Apesar de ser recolhida pela União, sua base de cálculo também seguirá a lógica do destino do consumo, o que significa que:

  • O valor do imposto será calculado com base na localidade do comprador final, e não no local da sede da empresa ou do faturamento.
  • Embora a arrecadação vá para o governo federal, a análise econômica e estatística da arrecadação será regionalizada, o que pode influenciar decisões de política pública e distribuição de verbas no futuro.

Características principais da CBS:

  • Não cumulativa: empresas terão direito a crédito do valor pago nas etapas anteriores da cadeia.
  • Aplicação uniforme para todos os setores, com exceções reguladas por lei complementar.
  • Recolhimento centralizado, com declaração eletrônica por meio de sistema unificado, o que facilita a fiscalização e cruzamento de dados.
  • Cobrança no destino, como forma de evitar distorções na localização de empresas.

Apesar de ser um tributo federal, a aplicação da CBS no destino harmoniza o modelo nacional com o que será praticado pelo IBS, garantindo que a lógica de “quem consome, paga” seja uniforme em todos os níveis de governo.

Tudo sobre CBS e IBS em: “CBS e IBS: o que são, quando começam e como afetam seu dia a dia”. 

Por que o modelo de tributação no destino foi adotado

A mudança para a tributação no destino representa um dos pilares mais estratégicos da Reforma Tributária brasileira. Essa alteração não é apenas técnica, ela carrega uma intenção política, econômica e social: corrigir distorções históricas no sistema de arrecadação e promover mais justiça federativa.

Ao longo das últimas décadas, o modelo de tributação na origem gerou desequilíbrios profundos entre estados produtores e consumidores, além de alimentar a chamada guerra fiscal, uma disputa entre entes federativos para atrair investimentos por meio de incentivos e renúncias fiscais.

O novo modelo responde a três grandes motivações: corrigir desigualdades, promover justiça fiscal e alinhar o Brasil às melhores práticas internacionais.

Desigualdade entre estados de origem e de consumo

A tributação na origem favoreceu estados com maior industrialização ou forte presença de grandes empresas exportadoras, como São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.

Enquanto isso, estados do Norte, Nordeste e Centro-Oeste com economia menos industrializada, mas altos índices de consumo, especialmente por causa de programas de transferência de renda, acabavam com uma participação menor na arrecadação nacional de tributos sobre o consumo.

Isso criou um cenário de concentração de receitas em poucas regiões, ampliando o fosso fiscal entre entes federativos e tornando estados dependentes do Fundo de Participação dos Estados (FPE) ou de medidas emergenciais de equilíbrio fiscal.

Ao tributar no destino, o sistema redistribui o valor arrecadado de acordo com a localização do consumidor final, permitindo que estados e municípios com maior população e consumo passem a receber mais daquilo que é gerado em seus territórios.

Busca por justiça fiscal e equilíbrio regional

Além de resolver desigualdades econômicas entre estados, a tributação no destino também promove equilíbrio dentro de um mesmo estado, especialmente entre capitais e municípios do interior.

Com a arrecadação sendo direcionada ao local onde ocorre o consumo, os recursos passam a circular de forma mais coerente com a realidade populacional e econômica das regiões, o que contribui para:

  • Maior capacidade de investimento em infraestrutura e políticas públicas;
  • Redução da dependência de repasses federais ou de medidas compensatórias;
  • Menor necessidade de adoção de incentivos fiscais agressivos para atrair empresas.

Esse modelo reforça a ideia de justiça fiscal territorial o dinheiro gerado pelo consumo volta para o local onde ele foi gerado, promovendo desenvolvimento mais equitativo.

Alinhamento com modelos de IVA adotados internacionalmente

Outro motivo forte para a mudança está no alinhamento do Brasil às práticas internacionais de IVA (Imposto sobre Valor Agregado).

Em países como:

  • Canadá
  • Austrália
  • México
  • União Europeia (bloco em geral)

O modelo de cobrança de impostos sobre consumo segue a lógica do destino. A arrecadação vai para a localidade onde a transação é concluída com o consumidor final.

Esse modelo:

  • Evita distorções fiscais e produtivas;
  • Reduz a guerra fiscal entre regiões;
  • Simplifica o sistema de controle e compensação entre entes subnacionais;
  • E torna o sistema mais transparente e eficiente para contribuintes e para a administração tributária.

O Brasil, ao adotar essa lógica na Reforma Tributária, se aproxima dos padrões da OCDE e fortalece sua posição em tratados internacionais, além de facilitar futuras reformas no sistema de comércio interestadual e eletrônico.

É contador? Leia também: “Reforma tributária para o contador: cronograma, rotinas e entregáveis por fase”. 

Tributação no destino e a repartição de receitas entre entes federativos

Uma das principais dúvidas de quem acompanha a Reforma Tributária é:  “Se a cobrança será no destino, como os entes federativos vão receber suas parcelas?”

A resposta está em um mecanismo de repartição automática e digital, com base no local do consumo final.

Esse novo sistema é essencial para que a lógica do destino funcione com eficiência, transparência e equidade, sem comprometer o fluxo de caixa dos estados e municípios.

Como funcionará o novo sistema de distribuição de recursos?

A proposta da Reforma cria um sistema centralizado de arrecadação e distribuição do IBS e da CBS, que contará com um Comitê Gestor nacional, composto por representantes da União, estados e municípios.

Funcionamento previsto:

  1. O contribuinte (empresa) recolhe o tributo em um sistema unificado como se fosse uma “conta única”.
  2. As informações da operação indicam o local do consumidor final (estado e município).
  3. O sistema distribui automaticamente a arrecadação para os entes federativos conforme a participação no consumo.

Esse modelo, chamado de “split payment” com repartição automatizada, exige uma forte estrutura tecnológica, mas reduz:

  • Fraudes;
  • Sonegação;
  • Conflitos entre entes federativos.

Fase de transição (2026 a 2032):

Durante esse período, a distribuição ainda será parcialmente baseada na origem da operação, com uma transição gradual para o modelo 100% destino.

A cada ano, aumenta a proporção da arrecadação distribuída com base no destino. Isso permite que estados que hoje concentram a arrecadação se ajustem gradualmente ao novo cenário.

Esse sistema representa uma das maiores inovações da Reforma Tributária, exigindo investimentos em tecnologia, capacitação fiscal e integração entre entes. Mas os ganhos em transparência, justiça fiscal e eficiência federativa são expressivos.

Leia também: “Extinção de impostos na Reforma Tributária: como acontecerá?”. 

Perguntas frequentes sobre tributação no destino

O que muda para as empresas com a tributação no destino?

Para as empresas, a maior mudança será a forma como o local de recolhimento do tributo é definido.

Atualmente, os tributos sobre o consumo (como ICMS e ISS) são recolhidos com base no local do estabelecimento fornecedor. Com a nova regra, o imposto será calculado e direcionado ao local onde está o consumidor final.

Isso muda:

  • A responsabilidade na apuração correta da localização do cliente;
  • A forma de emitir documentos fiscais (com dados mais detalhados);
  • A necessidade de adequação dos sistemas ERP e fiscais para suportar o novo modelo;
  • O acompanhamento mais próximo da repartição da receita entre entes federativos.

Apesar da mudança, o recolhimento continuará sendo feito por meio de um sistema unificado, o que reduz a complexidade operacional no médio e longo prazo.

Como será feita a transição entre origem e destino?

A Reforma prevê uma transição gradual de oito anos, de 2026 a 2033, para que estados, municípios e empresas se adaptem à nova lógica de tributação no destino.

Durante esse período:

  • Haverá um sistema misto, onde parte da arrecadação ainda será feita com base no local de origem, e outra parte com base no destino do consumo;
  • O percentual da arrecadação com base no destino aumentará progressivamente a cada ano;
  • A alíquota de referência do IBS será aplicada durante o período para cálculo e compensação entre os entes federativos;
  • O Comitê Gestor do IBS será responsável por operacionalizar essa transição.

Esse período de adaptação foi pensado para evitar choques financeiros nos estados que mais arrecadam atualmente e para dar tempo às empresas ajustarem aos novos procedimentos.

A nova regra vale para todos os tipos de operações?

A princípio, sim, a regra da tributação no destino será aplicada a todas as operações de bens e serviços, inclusive:

  • Vendas interestaduais e internas;
  • Prestação de serviços digitais;
  • Comércio eletrônico (e-commerce);
  • Operações de importação e exportação (com exceções específicas);
  • Operações entre empresas e consumidores finais.

Contudo, a lei complementar que regulamentará o IBS e a CBS poderá prever exceções ou regras específicas para determinados setores, como:

  • Regimes especiais de tributação;
  • Produtos com regime monofásico (ex.: combustíveis, bebidas, energia elétrica);
  • Simples Nacional, MEIs e operações com cooperativas.

Portanto, é essencial que as empresas acompanhem os desdobramentos da regulamentação, que está prevista para 2025.

Qual a diferença entre o local da operação e o local da tributação?

Essa é uma dúvida comum e fundamental no novo modelo.

  • Local da operação: é onde ocorre o ato jurídico ou comercial, por exemplo, onde a nota fiscal é emitida, onde está localizada a sede da empresa, ou onde o produto foi despachado.
  • Local da tributação (no destino): é o endereço onde o bem será efetivamente utilizado ou consumido, ou onde o tomador do serviço está estabelecido.

Essa distinção exige que o contribuinte informe corretamente o endereço do cliente e entenda que o imposto não será mais destinado ao local da emissão da nota fiscal, mas sim ao local de uso ou consumo do produto ou serviço.

Todas as respostas sobre a Reforma Tributária em: “Reforma Tributária: todas as respostas que você precisa”. 

Conclusão: a tributação no destino é um pilar da Reforma e um passo para um sistema mais equilibrado

A adoção da tributação no destino é muito mais do que uma mudança operacional na forma de recolher impostos sobre o consumo. Trata-se de uma reorganização estrutural do pacto federativo, que busca corrigir distorções históricas, promover justiça fiscal entre estados e municípios e alinhar o sistema tributário brasileiro às melhores práticas internacionais.

Ao colocar o foco no local onde o consumo efetivamente acontece, o novo modelo fortalece a ideia de que os tributos devem retornar à sociedade de acordo com sua contribuição real para a economia. Com isso, cidades e estados com maior população e demanda por bens e serviços passam a ter maior autonomia financeira para investir em políticas públicas locais.

Para as empresas, a transição exigirá adaptação de sistemas, processos e estratégias fiscais. No entanto, os benefícios de um sistema mais simples, transparente e previsível , com regra uniforme em todo o território nacional, compensam o esforço de implementação.

A tributação no destino é, portanto, um dos pilares centrais da Reforma Tributária, e representa um passo essencial rumo a um modelo mais moderno, justo e funcional de arrecadação. Um caminho para que o Brasil supere suas desigualdades regionais, estimule o crescimento de forma equilibrada e fortaleça a relação entre contribuintes, empresas e entes públicos.

Foto de Hellen Mota
Hellen Mota
Hellen Mota é jornalista e redatora. Escreve de forma simples e acessível, ajudando empreendedores a conquistar mais autonomia e segurança.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

5

passos simples para obter seu Certificado Digital

Baixe o infográfico e veja como é fácil fazer tudo online.

Simulação de um impressão digital tecnológica em uma tela de computador.

5

passos simples para obter seu Certificado Digital

Baixe o infográfico e veja como é fácil fazer tudo online.

Simulação de um impressão digital tecnológica em uma tela de computador.

Índice

Compartilhar esse conteúdo:

Índice